Até o momento, os fiapos de têxteis sintéticos liberados no esgoto pelas lavadoras não eram classificados como agentes poluidores. Estudo de universidade inglesa alerta para perigo potencial do microplástico doméstico.
Lavar roupas sintéticas na máquina a temperatura normal causa a liberação no esgoto de grandes quantidades de minúsculas fibras de plástico, constataram cientistas da Unidade Internacional de Pesquisa de Dejetos Marinhos da Universidade de Plymouth, Inglaterra.
Essa é a primeira pesquisa a identificar os fiapos da roupa lavada como uma fonte de poluição. Eles se adicionam às preocupações quanto a outras variedades maiores e mais visíveis de lixo plástico, que resultaram em medidas como a proibição de sacolas de compras feitas desse material.
O número de microfibras liberadas (com cinco a milímetros de comprimento, em média) depende tanto dos têxteis quanto do tipo de sabão utilizado. Uma carga típica, de seis quilos, de peças de lã acrílica (por exemplo, cobertores felpudos) gera mais de 700 mil fibras; uma de poliéster (por exemplo, suéteres sintéticos) chega a quase 500 mil; enquanto tecidos mistos de algodão-poliéster emitem cerca de 140 mil fibras a cada ciclo de lavagem.
Perigo da lavadora para os oceanos
Em seu relatório, os pesquisadores Imogen Napper e Richard Thompson deixam clara a importância da nova constatação: "A expectativa é que a quantidade de microplástico no meio ambiente aumentará [...] e há apreensões sobre seu potencial danoso, caso ingerido."
Outros estudos mostraram que esse tipo de fibra é encontrado corrente abaixo das estações de tratamento de esgoto. Embora a água usada das lavadoras domésticas seja normalmente filtrada nessas unidades, os minúsculos fiapos nem sempre ficam retidos. Por isso, "as fibras liberadas na lavagem de roupa podem ser uma importante fonte de microplástico nos habitats aquáticos", afirmam os autores.
Ainda não se sabe a extensão dos efeitos das microfibras plásticas nos mares e lagos mundo afora. Pesquisas mostraram que grandes quantidades são ingeridas pelos organismos marinhos, desde o zooplâncton até pássaros e mamíferos, passando por crustáceos e peixes. Por fim, os humanos fechariam esse ciclo alimentar, ao consumir peixes e frutos do mar.
Transportadores de venenos
Um outro relatório recente da Greenpeace, centrado no microplástico de comprimento inferior a cinco milímetros – incluindo esferas, fragmentos e filamentos, como os decorrentes da lavagem de tecidos sintéticos – suscitou uma revisão da literatura científica.
"Agora sabemos que o microplástico no mar pode ter um efeito ainda maior do que o macroplástico", concluiu a ONG ambiental. O macroplástico é encontrado, por exemplo, na forma de pedaços de redes de pescar ou de embalagens para latas de cerveja, que frequentemente estrangulam os peixes, pássaros ou mamíferos marinhos que ficam presas nelas.
Por serem tão pequenos, contudo, os pedaços de microplástico têm potencial para ser engolidos por um número muito maior de organismos marinhos. Além disso, como sua superfície pode absorver e liberar substâncias tóxicas, eles servem como transportadores de venenos.
"Grande parte dos aditivos e contaminantes químicos associados ao microplástico, ou que tende a logo se acumular em sua superfície, é certamente significativa para a saúde humana, assim como para a da fauna selvagem", apontou a Greenpeace em seu relatório.
Impacto sobre a digestão
Amostras de diversos oceanos provaram que atualmente o microplástico é onipresente nos mares, e que sua ingestão por organismos marinhos é muito difundida. Até o momento, contudo, pouco se sabe sobre como o material afeta as cadeias alimentares marinhas.
Por outro lado, estudos de campo e experimentos sob condições controladas indicam que a ingestão do microplástico por peixes e crustáceos reduz a digestão, podendo ter sério impacto sobre os intestinos dos peixes e reduzir o vigor de espécies que vão de vermes anelídeos a caranguejos.
O que ainda não está claro é se os fragmentos, ou quaisquer toxinas que transportem, têm a capacidade de se "bioacumular" pela cadeia alimentar acima, afetando também os humanos que consumam peixes ou crustáceos.
Possíveis soluções
Os pesquisadores da Universidade de Plymouth dizem que, embora defendam a redução do volume de microfibras que cheguem até o meio ambiente, não reivindicam o banimento dos produtos têxteis sintéticos – como aquele imposto nos Estados Unidos às microesferas de plástico, a partir de meados de 2017.
"Uma das considerações que guiou a intervenção regulamentar foi a ausência de benefícios sociais em incorporar partículas esféricas de microplástico aos cosméticos, associada às considerações sobre os impactos ambientais", explica Richard Thompson.
Os benefícios sociais dos têxteis, por sua vez, são inegáveis. "Portanto, qualquer intervenção voluntária ou regulamentar deve ser no sentido de reduzir as emissões de fiapos de microplástico, seja através de modificações do design têxtil, seja a filtragem das águas usadas, ou ambos", enfatiza o cientista inglês.
Fonte: DW.