Ameaçados de extinção, primatas não transmitem a doença, são tão vítimas quanto os humanos, e cumprem função de alerta sobre o surgimento do vírus.
As mortes de macacos que habitam o bioma da Mata Atlântica preocupam o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Primatas Brasileiros (CPB) do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Das 24 espécies existentes na Mata Atlântica, 18 já estão na lista de ameaçados de extinção, entre eles, os bugios, o macaco-prego-de-crista, os sauás (ou guigós) e os saguis-da-serra. Isso significa que quase 70% das espécies de primatas deste bioma está ameaçada de extinção.
A preocupação do CPB está exatamente na situação de mortes de macacos por humanos por medo da febre amarela. As notícias mostram os frequentes registros de agressões e de mortes de macacos por pessoas que temem ser contaminadas pelos animais nas localidades onde atualmente ocorrem casos da doença no país. “Neste contexto, a febre amarela pode ser o golpe fatal para várias populações dessas espécies já altamente impactadas”, ressalta o coordenador do CPB, Leandro Jerusalinsky. "Além dos problemas históricos como desmatamento, fragmentação de habitat e caça, há ainda a febre amarela colocando em risco a sobrevivência dos primatas, já que alguns dos gêneros como o Alouatta (bugios, barbados, guaribas) são altamente suscetíveis à febre amarela ", complementa.
Segundo o Instituto de Diagnóstico, Vigilância, Fiscalização Sanitária e Medicina Veterinária Jorge Vaitsman (IJV), 131 macacos morreram desde o início de 2018 até o dia 25 de janeiro no Estado do Rio de Janeiro. Dos 131, 90 deles não foram mortos pela doença, mas envenenados ou mortos a pauladas por humanos. As pessoas temem que os macacos possam transmitir diretamente a doença aos humanos. Entretanto, os macacos não transmitem o vírus da febre amarela. Pelo contrário. São tão vítimas quanto os humanos. Os responsáveis pela transmissão do vírus da febre amarela são os mosquitos dos gêneros Haemagogus ou Sabethes.
"Esse receio é infundado. Isso não ocorre, uma vez que o vírus é transmitido unicamente pelos mosquitos. Em vez de agredidos ou mortos, os macacos devem ser protegidos, não apenas como parte do patrimônio natural do Brasil, mas também para que possam cumprir a função de sentinelas, já que a presença de macacos mortos ou doentes serve de alerta para a possível circulação do vírus da febre amarela numa região", defende Jerusalinsky.
Os macacos cumprem uma função importante: ao serem contaminados pelo vírus, transmitido em ambientes silvestres por mosquitos, eles servem de alerta para a presença do vírus no local. Desse modo, contribuem para que os órgãos responsáveis pela saúde pública tomem logo medidas para proteger moradores ou pessoas de passagem na região por meio da vacinação, conforme preconizado pelo Ministério da Saúde.
Jerusalinsky afirma que a forma mais efetiva de se prevenir contra a febre amarela é a vacinação, seguindo as orientações do Ministério da Saúde. Outra forma é evitando viajar às regiões onde há casos confirmados da doença. Também ressalta que é importante as pessoas frequentarem as unidades de conservação, assim como todas as áreas silvestres nas áreas com potencial circulação do vírus, vacinadas.
Segundo ele, os Planos de Ação Nacional para Conservação dos Primatas, coordenados pelo CPB/ICMBio, e implementados com diversas instituições parceiras, definem estratégias para diagnosticar os impactos das doenças em circulação no país sobre os macacos. "Já há pesquisas sendo desenvolvida para primatas em diversas regiões, como no Espírito Santo, que sofreu grande impacto no verão passado", conta Jerusalinsky. Segundo ele, é necessário intensificar a comunicação de informações corretas para que a população seja uma defensora dos primatas. "Os macacos são tão vítimas do vírus da febre amarela quanto os humanos. O primata é nosso principal aliado para prevenir que pessoas adoeçam e morram por essa enfermidade ".
De acordo com ele, em último caso, também é necessário ampliar a fiscalização e aplicar as penas cabíveis às pessoas que agridem ou matam macacos. "Isso é crime ambiental, previsto na Lei 9.605/98", afirma. Entre outras coisas, a lei estabelece prisão de seis meses a um ano e multa para quem matar, perseguir ou caçar espécimes da fauna silvestre, em desacordo ou sem a devida licença da autoridade competente. A pena é aumentada em 50% quando o crime é praticado contra espécies ameaçadas de extinção.
O QUE FAZER
- Ao encontrar um macaco morto ou doente, a população deve informar ao serviço de saúde do município, do estado ou ligar para o Disque Saúde (136), serviço do Ministério da Saúde.
- Nada de manipular os animais (não por risco de contrair a febre amarela, mas outras doenças). Caberá aos técnicos da área de saúde avaliarem se há possibilidade de coletar amostras para análise em laboratório e se a morte foi isolada ou atingiu um número maior de primatas.
- Em casos de maus-tratos a macacos, as pessoas devem denunciar aos órgãos ambientais (Ibama, ICMBio, Polícia Militar Ambiental e secretarias municipais e estaduais de Meio Ambiente).
- O Ibama recebe denúncias de maus-tratos a animais silvestres pelo telefone 0800-618080 (de segunda a sexta, das 8h às 18h). Fotos e vídeos facilitam a investigação do crime e a identificação dos responsáveis.
- Ao encontrar macacos vivos, sadios e em vida livre, as pessoas não devem capturá-los, retirá-los de seu habitat, alimentá-los, levá-los para outras áreas, agredi-los ou muito menos matá-los.
SAIBA MAIS
Segundo o Ministério da Saúde (MS), a febre amarela não é contagiosa, portanto, macacos não transmitem diretamente a doença, assim como ela não é transmitida diretamente de um humano a outro. Os mosquitos são os vetores, transmitindo-o entre primatas humanos e não-humanos (macacos).
o vírus da febre amarela possui dois ciclos básicos: urbano e silvestre. No ciclo silvestre, a transmissão é feita pelos mosquitos Haemagogus e Sabethes, os mais frequentes na América Latina.
Há mais de 70 anos, não há no Brasil registros da febre amarela em áreas urbanas. Nas cidades, o mosquito Aedes aegypti é o vetor responsável pela disseminação da doença, sendo que os últimos casos de febre amarela urbana foram registrados em 1942, no Acre.
A doença mantém-se nas regiões tropicais da América do Sul e Central e da África. No Brasil, tem caráter sazonal, ocorrendo mais frequentemente entre os meses de dezembro a maio, quando fatores ambientais (como o aumento de chuvas e de temperatura) propiciam o surgimento dos vetores (mosquitos).
As principais medidas de prevenção para humanos incluem a vacinação e o controle da proliferação dos mosquitos vetores. A orientação é que as pessoas que vivem em áreas de risco ou vão viajar para regiões silvestres, rurais ou de mata dentro dessas áreas, devem se imunizar (tomar a vacina).
O controle da febre amarela em área urbana também passa pelo trabalho de preservação dos habitats dos primatas não-humanos silvestres (macacos). Desflorestar ou matar macacos não impede a circulação do vírus da febre amarela, podendo ainda eliminar o papel de "sentinela" dos primatas e, portanto, essa sua valiosa e insubstituível contribuição para a saúde pública.
Os macacos são infectados ao serem picados pelos mosquitos, em período de viremia (presença do vírus no sangue), mas eles não repassam o vírus e podem até morrer, principalmente as espécies mais sensíveis à doença. Já os humanos, ao circularem em áreas silvestres, podem ser picados por mosquitos infectados, contraindo a doença.
Já em macacos, a viremia dura cerca de 3 a 4 dias, com a morte podendo ocorrer entre 3 a 7 dias.
Fonte: Comunicação ICMBio.