Page 26 - Uma Breve História da Legislação Florestal Brasileira
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50% da área das propriedades poderão sofrer exploração a corte raso . Desse modo, acabou
perdurando a interpretação de que as áreas que viriam a ser conhecidas como Reserva Legal
na Amazônia devem ser de, no mínimo, 50%.
É possível identificar três fatores principais que fundamentavam o estabelecimento
de uma Reserva Legal mais extensa na Amazônia e nas “áreas incultas”. Em primeiro lugar, a
partir dos anos 1950, as florestas nativas da Amazônia passaram a ser vistas como um recurso
econômico importante e que demandavam uma gestão racional. Entre o final do século XIX
e as primeiras décadas do século XX, o látex extraído da seringueira (Hevea brasiliensis) e do
caucho (Castilla ulei) para produção de borracha era o principal motor da economia da região.
Porém, com o sucesso das plantações de seringueira no sul da Ásia a partir de sementes roubadas
pelo governo britânico no início do século, o produto brasileiro perdeu competitividade no
mercado internacional. Durante a Segunda Guerra, houve um ressurgimento da economia da
borracha, porém, com o restabelecimento das rotas comerciais asiáticas e a criação da borracha
sintética, “deixara de ser remuneradora sua produção silvestre e encontrou-se a Amazônia com
a grande crise” (Bonfim, 1953, p. 7-8).
Foi nesse contexto que o governo brasileiro criou, em 1953, a Superintendência do
Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA) e pediu o auxílio da Organização para
Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO) para a realização de uma série de estudos
para identificar alternativas de desenvolvimento rural no país, com foco no setor florestal. Uma
das principais atividades na colaboração com a FAO foi a avaliação do potencial econômico da
produção madeireira na Amazônia. Desse modo, durante a década de 1950, foram instalados
centros experimentais de produção madeireira no Amapá e no Pará e foram realizados grandes
inventários florestais em uma área de 15 milhões de hectares na região entre os rios Tapajós e Xingu
(Heinsdijk, 1957; Day, 1960). Apesar da preocupação em estudar e utilizar de modo sustentável
os recursos florestais da Amazônia, esses projetos tinham um viés claramente produtivista. Isso
fica claro em um estudo da FAO para o governo brasileiro:
Soube-se por muito tempo, e foi confirmado por recentes pesquisas, que o
valor da produção madeireira de florestas nativas da Amazônia não pode ser
superestimado. Em primeiro lugar, o solo onde elas crescem é muito pobre, e
as partes com solos mais ricos devem ser reservadas para a agricultura. Além
disso, os conjuntos de espécies são tão misturados que a exploração de grandes
quantidades homogêneas de madeira da mesma espécie (ou grupos de espécies)
encontra dificuldades insuperáveis. Consequentemente, é importante encontrar
modos para melhorar o povoamento florestal, para dar a elas uma melhor
composição, para torná-las mais homogêneas. Esse é principalmente um pro-
blema de silvicultura, onde a definição se esse resultado deva ser alcançado pelo
melhoramento da floresta primária ou por plantações de árvores é uma questão
de importância secundária. (Drees, 1957, tradução nossa)
19 Artigo 44 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.
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