Page 139 - Uma Breve História da Legislação Florestal Brasileira
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reconhecida pelas Metas de Aichi, estabelecidas no contexto da Convenção da Biodiversidade da ONU
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de 2010 (COP-10) , e, em 2015, foi inserida nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) .
Um caso emblemático que explicita a necessidade da adoção do pensamento complexo
para rechaçar a pura incidência do artigo 61-A do Código Florestal é o caso da turbidez das águas
do Rio da Prata, localizado no município de Bonito, Mato Grosso do Sul, cujas principais cabeceiras
são formadas por uma rede complexa de nascentes, que formam um “brejão”, que se estende por
cinco mil hectares, localizados nos municípios de Jardim e Bonito. Trata-se de uma área de veredas,
definida pelo artigo 3º, inciso XII, da Lei 12.651/2012, protegida como de preservação permanente
(artigo 4º, XI, do mesmo diploma).
Ocorre que a partir de 2005, especialmente, o brejão foi alvo de drástica expansão do cultivo
de grãos, o que desencadeou um processo de destruição das áreas úmidas por meio da construção de
drenos. Além disso, essas áreas de veredas são desprovidas de cercamento, o que favorece o pisoteio
pelo gado. Há tanto situações ilícitas perpetradas antes de 22 de julho de 2008 como ilícitos recentes,
detectados pelos órgãos ambientais competentes. O fato é que o conjunto de práticas inadequadas de
manejo do solo, a implantação de drenos, o desmatamento e a redução das faixas de matas ciliares para
uso nas culturas e a substituição da vegetação nativa de vereda por espécies exóticas de pastagem ou
monoculturas concorreu para a degradação do brejão, com o subsequente carreamento de sedimentos
e resíduos de agrotóxicos para o Rio da Prata, cujas águas cristalinas, que encantam os turistas de todo o
mundo, passaram a apresentar turbidez quando do incremento de chuvas(Gris e Figueiredo, 2019).
Ainda que o estado do Mato Grosso do Sul, por meio de um decreto recente, preveja medidas
de governança e exigência de boas práticas, buscando regrar o futuro da bacia hidrográfica do Rio da
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Prata , os passivos deverão ser restaurados, pois há nexo causal entre a sua consolidação e os danos
atuais complexos que estão sendo observados. Ou seja, a estrutura causal exige uma abordagem
sistêmica e unitária, que compreenda tanto as situações consolidadas como os novos ilícitos
perpetrados, todos contribuindo para a degradação ambiental da bacia.
Conclusões
Por todo o exposto, tem-se que a flexibilização da exigência de recomposição das áreas
de preservação permanente onde há atividades agrossilvipastoris consolidadas, a que se referem
os artigos 61-A e 61-B do Código Florestal, por se relacionar, sobretudo, com a responsabilidade
administrativa por ilícitos ambientais, não exclui a possibilidade de responsabilização civil dos
90 Disponível em: <https://www.mma.gov.br/biodiversidade/conven%C3%A7%C3%A3o-da-diversidade-biol%C3%B3gica.html>.
91 O sub-objetivo 15.1 afirma: “até 2020, assegurar a conservação, recuperação e uso sustentável de ecossistemas terrestres e
de água doce interiores e seus serviços, em especial florestas, zonas úmidas, montanhas e terras áridas, em conformidade com
as obrigações decorrentes dos acordos internacionais”; e o sub-objetivo 15.9 afirma “integrar os valores dos ecossistemas e da
biodiversidade ao planejamento nacional e local, nos processos de desenvolvimento, nas estratégias de redução da pobreza e nos
sistemas de contas”.
92 Mato Grosso do Sul. Decreto nº 15.197, de 21 de março de 2019, que disciplina o procedimento de apresentação
de Projeto Técnico de Manejo e de Conservação de Solo e Água para implantação de atividades que demandem ações de
mecanização de solo nas Bacias de Contribuição do Rio da Prata e do Rio Formoso, nos municípios de Jardim e Bonito, e dá
outras providências.
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