Page 135 - Uma Breve História da Legislação Florestal Brasileira
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Lúcia destacou a adoção, pelo legislador, de “critérios de proporcionalidade e razoabilidade adequados
ao meio ambiente da produção agrossilvipastoril e à diversidade da estrutura fundiária brasileira”
(STF, 2018, p. 303).
No entanto, o STF expressamente sinalizou para a possibilidade de os órgãos ambientais
competentes realizarem a adequação dos critérios de recomposição das APPs, diante da realidade
fática; e também reconheceu, ao apreciar a constitucionalidade do artigo 3º, inciso IX, da Lei
12.651/2012, que a intervenção em APPs é excepcional, por interesse social ou utilidade pública,
condicionada à inexistência de alternativa técnica e/ou locacional à atividade proposta. Disso se
depreende a assimilação pela Corte de que a conservação desses espaços territoriais representa uma
estratégia decisiva para a manutenção de serviços ecológicos essenciais, nos termos do artigo 225,
parágrafo 1º, I, da Constituição Federal de 1988.
Nessa perspectiva, cumpre observar que o artigo 61-A trata de faixas mínimas de
recomposição obrigatória, o que está expresso nos seus parágrafos 5º, 6º e 7º. Além disso, no artigo
61-A, parágrafo 14, consta que “em todos os casos previstos neste artigo, o poder público, verificada
a existência de risco de agravamento de processos erosivos ou de inundações, determinará a adoção
de medidas mitigadoras que garantam a estabilidade das margens e a qualidade da água, após
deliberação do Conselho Estadual do Meio Ambiente ou do órgão colegiado estadual equivalente”.
Por sua vez, o artigo 61-A, parágrafo 17, prevê que, nas bacias hidrográficas consideradas
críticas, conforme previsto em legislação específica, o chefe do poder executivo poderá, em ato
próprio, estabelecer metas e diretrizes de recuperação ou conservação da vegetação nativa superiores
ao previsto no caput, ouvidos o Comitê de Bacia Hidrográfica e o Conselho Estadual do Meio Ambiente.
Portanto, em uma interpretação sistemática e coerente desses dispositivos, à luz do que foi
enunciado pelo STF, tem-se que há um aspecto técnico-científico, de caráter substantivo, que precisa
ser considerado quando da definição das faixas de recomposição de APPs, sobretudo nos casos de
nascentes e olhos d’água, do entorno de lagos e lagoas naturais e de veredas, em que a lei estabeleceu
parâmetros mínimos de recomposição obrigatória.
Assim, o direcionamento da flexibilização em relação às ocupações consolidadas deve
ser interpretado como uma norma geral a respeito do regime de recomposição da vegetação
remanescente nessas áreas. Mas, em casos especiais, como nos processos erosivos, por exemplo, as
metas e as diretrizes de recuperação ou conservação poderão ser mais exigentes, o que deixa em
aberto uma brecha para que se possa compelir os proprietários e possuidores a repararem danos
ambientais associados ao deficit de recuperação das APPs.
O fundamento para essa interpretação é a necessidade de hermenêutica coerente, não
contraditória e sistemática do sistema jurídico constitucional, pois o Código Florestal deve ser
compatibilizado como o artigo 225 da Constituição Federal de 1988, segundo o qual incumbe ao
Estado “preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais”, “prover o manejo ecológico das
espécies e ecossistemas” e “recuperar o meio ambiente degradado”.
Poder-se-ia argumentar que o artigo 61-A, nos parágrafos 1º, 2º e 3º, prevê faixas em limites
taxativos, que variam de 5 a 15 metros, conforme o módulo fiscal, e que o artigo 61-B estabelece
percentuais máximos de recomposição. Porém, mesmo aqui, os parágrafos 9º e 10º do artigo 61-A
afirmam, respectivamente, a necessidade de adoção de técnicas de conservação do solo e da água
que visem à mitigação dos eventuais impactos e de “boas práticas agronômicas”. Tais dispositivos
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