Page 107 - Uma Breve História da Legislação Florestal Brasileira
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comercialização, inovação e aceleração para fins de recuperação, conservação e uso sustentável dos
recursos ambientais.
O inciso I prevê o uso de PSA, um mecanismo que oferece um incentivo a todo aquele que
presta um serviço ambiental através de proteção, recuperação ou incremento da produção de um
serviço ecossistêmico. Serviços ecossistêmicos são os benefícios obtidos dos ecossistemas, divididos
em serviços de provisão, de suporte, reguladores e culturais (MEA, 2003). A doutrina costuma
enquadrar esses serviços nas modalidades carbono, água, biodiversidade e beleza cênica (Guedes e
Seehusen, 2012, p. 19). Das alíneas “a” até “h” desse inciso são listadas oito modalidades de serviços
ambientais aptos a participar de um PSA, sendo todas elas passíveis de enquadramento em uma das
quatro categorias acima referidas.
Importante destacar a modalidade de serviço ambiental listada na alínea “h”, qual seja, a de
manutenção de Área de Preservação Permanente (APP), Reserva Legal (RL) e uso restrito (AUR). Por
se tratar de áreas sujeitas à limitação administrativa, cuja manutenção ou recuperação se constitui
em obrigação legal, defendem alguns não ser possível o uso de recursos públicos para tal tipo
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de incentivo . Com efeito, o artigo 12 da Lei n 6.938/1981 condiciona a concessão de incentivos
governamentais ao cumprimento das normas ambientais vigentes. Contudo, estando a propriedade
em processo de regularização, nos termos autorizados pela lei, nada impede que se beneficie de um
programa de incentivo, como forma de facilitar a sua regularização. O próprio parágrafo 1º, inciso III
do artigo 41 do Código Florestal prevê a possibilidade de utilização de crédito público, reembolsável
ou não, para as atividades de compensação, recuperação ou recomposição de APP, RL e AUR cujo
desmatamento tenha ocorrido até 22/07/2008.
Outro argumento recorrente contra a inserção de APP, RL e AUR em programas de PSA seria a
“ausência de adicionalidade” pela existência de uma prévia imposição legal quanto à conservação ou à
recomposição dessas áreas. A adicionalidade, no contexto de um PSA, é entendida como a capacidade
de aumento da provisão de serviços ambientais em comparação a um cenário sem o uso do PSA
(Wunder, 2009, p. 16). Analisando a questão, sob ponto de vista da eficiência, a adicionalidade deveria ser
perseguida pois, como ressalta Wunder (2007, p. 53), o provedor ideal de serviços ambientais é aquele
capaz de oferecer a maior adicionalidade possível. Contudo, buscar a maior eficiência possível não
significa tornar a adicionalidade um requisito essencial, pois, como destaca Leonardo Papp (2019, p. 193),
tal requisito apresenta problemas de ordem técnica e de equidade. Ana Maria Nusdeo (2012, p. 155)
elenca uma série de argumentos de ordem prática que justificam a adoção de PSA nessas áreas sujeitas à
limitação administrativa, dentre os quais a ausência de efetividade de alguns instrumentos de comando
e controle, além do reconhecimento do princípio do protetor-recebedor. Trata-se, portanto, de uma
opção política a ser exercida pelo Poder Legislativo. Diversos estados que já possuem legislação sobre
a matéria fizeram sua opção pelo uso de PSA em APP e RL, embora conferindo benefícios adicionais
àqueles que tivessem tais áreas conservadas (Stanton e Tejeiro, 2014, p. 55).
64 Essa discussão foi foco de intenso debate no Congresso Nacional, durante a tramitação dos projetos de lei que dispunham
sobre a Política Nacional e o Programa Federal de PSA. Iniciada durante a tramitação do PL 792/2007, a discussão foi
aprofundada na tramitação do PL 312/2015, cujo texto final foi aprovado na Câmara dos Deputados em setembro de 2019 e
remetido ao Senado Federal, alterado, aprovado e convertido na Lei nº 14.119, de 13 de janeiro de 2021, que institui a Política
Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais; e altera as leis nº 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro de
1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política.
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