Page 18 - Uma Breve História da Legislação Florestal Brasileira
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recém-adquirida, reduzindo, na prática, a área protegida. As florestas protetoras também estavam
em grande parte desprotegidas, visto que a norma não estabelecia regras para a definição das Áreas
de Preservação Permanente (APPs) às margens dos rios e lagos, e o Ministério da Agricultura não
regulamentou o assunto. O governo também não dispunha de recursos suficientes para criar a
Polícia Florestal, prevista no decreto, ficando a fiscalização a cargo do poder local e do interesse
dos latifundiários. E, ainda, de modo similar aos projetos de lei sobre licenciamento atualmente
em curso, o código permitia o desmate sem consentimento formal do governo, caso os órgãos
competentes demorassem mais de 30 dias para se manifestar (Dean, 1996, p. 277-8).
Nesse período de edição e vigência do Código Florestal de 1934, nascia o ativismo am-
biental brasileiro, com a fundação de organizações da sociedade com cunho conservacionista, a
exemplo da Sociedade de Amigos das Árvores, fundada em 1931, e da Sociedade de Amigos da
Flora Brasílica, em 1939 (Franco e Drummond, 2010). Contudo, destacam os autores, o discurso
conservacionista aglutinou-se apenas a partir do primeiro boletim da Fundação Brasileira para
Conservação da Natureza (FBCN, fundada em 1958, no Rio de Janeiro), de 1966, posteriormente
à edição do Código Florestal de 1965.
Código Florestal de 1934: uma ideia fora do lugar?
Drummond (1998–1999, p. 127), ao analisar uma “série relativamente longa de leis, decretos e
regulamentos de caráter ambiental, emitida pelo Governo Federal brasileiro entre 1934 e 1988”, constata
que a “legislação ambiental”, constituída no século XX, principalmente no período 1970-1990, formou
uma ampla e “moderna legislação ambiental” mas que sofria do mal de não ser cumprida. E afirma que
ambientalistas “inativos e governantes irresponsáveis formariam [...] uma combinação capaz de fazer
toda a nossa legislação ambiental parecer como muitas outras leis brasileiras – são as mais avançadas do
mundo, mas ‘não pegam’...” (Drummond, 1998–1999, p. 145, grifo do autor).
Dean (1996) também coloca essa questão e postula que o Código Florestal foi influenciado
por intelectuais de classe média preocupados com o impacto da ação humana sobre o mundo
natural. Intelectuais que, nos primeiros anos do governo Vargas, tiveram oportunidade de, como
burocratas, influenciar na legislação, com a instalação do Estado Novo (1937–1945), enquanto a falta
de democracia e os assessores militares menos sensíveis a tal problemática afastaram um pouco
o governo de tais questões (Dean, 1996, p. 272-279). Dean mostra que havia dezenas de grupos e
milhares de núcleos preocupados com árvores, pássaros, rios, entre outros, e Silva também enfatiza
que a “mobilização dessas forças seguramente interferiu nos rumos da formulação da legislação
ambiental no período inicial do governo Vargas, mesmo que alguma dessas leis nem sempre
contemplem as reivindicações dos ativistas em sua integralidade” (Silva, 2005, p. 214).
Entretanto, esses autores argumentam que tal legislação, influenciada pelos debates que
ocorriam nos Estados Unidos e na Europa, era inadequada ao contexto brasileiro. Não havia aqui
infraestrutura nem grupos de pressão para transformar a lei em prática. Seria uma ideia fora de lugar
em um momento histórico, em que o Brasil era rural, autoritário, caracterizado pela família patriarcal,
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