Page 12 - Uma Breve História da Legislação Florestal Brasileira
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normas seriam rígidas, mas com pouca aplicabilidade. De modo similar, Dean (1996) afirma
          que a legislação foi descumprida e que o brasileiro foi péssimo em converter capital natural
          em riqueza, enfatizando a destruição da Mata Atlântica no período colonial como expressão
          da expansão predatória da agropecuária.
               Outros autores questionam a imagem da gestão florestal colonial como sendo ao mesmo
          tempo rígida e ineficaz. Com relação ao primeiro ponto, Cabral e Cesco questionam a tese
          de Miller argumentando que “a política florestal metropolitana não era realmente rígida nem
          mesmo nas suas intenções – quando tentou ser (a partir de 1797), sua derrocada foi estrondosa.
          A interpretação e aplicação da instituição das ‘madeiras de lei’ eram muito flexíveis, gerando, na
          prática, um regime de acesso preferencial e não de acesso exclusivo da Coroa” (Cabral, 2007,
          grifo do autor). Na mesma linha, Castro trabalha contra a pecha de que o brasileiro é um péssimo
          gestor e afirma que a gestão da atividade florestal no período colonial teve importante aspecto
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          conservacionista . Essa tese também é confirmada por Cabral (2014, p. 466), que vai além, ao
          argumentar que:

                           Na verdade, a Coroa portuguesa sempre demonstrou entender que o sucesso fiscal
                           de sua colônia americana dependia do uso sustentado das suas matas. Quem não
                           tem cão caça com gato e a decepção inicial com a ausência de metais preciosos
                           fê-la realizar – pelo menos até as descobertas auríferas de fins do seiscentos – que a
                           floresta era tudo que ela tinha nessas terras distantes.

               Mesmo após a descoberta do ouro e a intensificação da derrubada da Mata Atlântica,
          a legislação teve um papel na gestão dos recursos florestais, ainda que de modo restrito e
          contraditório. Esse entendimento, segundo Cabral (2014, p. 462), busca superar a “crônica
          de destruição” ambiental, que percebe no ser humano uma espécie de “erro da natureza”, que
          esteve sempre a destruí-la . O autor argumenta que a “riqueza florestal brasileira foi utilizada
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          mais como nutriente agrícola do que como biomassa integral (madeira)” (Cabral, 2014, p. 477).
          Isso se deve a fatores determinantes como o alto custo de transporte e os arranjos de poder que
          restringiam a poucos o acesso a contratos régios de exploração florestal. Ou seja, as obrigações e
          os limites legais podiam ser facilmente descumpridos, pois os grandes proprietários ignoravam
          a legislação (Cabral, 2014, p. 323). Ao mesmo tempo, as populações mais pobres dificilmente
          obtinham autorização para utilizar os recursos florestais. Nesse sentido, Cabral reflete a respeito
          da conjuntura social e política na efetividade da implantação da norma, da conservação e da
          gestão florestal na América portuguesa:







          4   Castro (2002), Dean (1996) e muitos outros trabalhos procuram questionar a imagem do brasileiro enquanto um gestor
          florestal excepcionalmente “perdulário” (Carvalho, 2005).
          5  Schama (1996, p. 23) denomina uma história de “penitência” aquela que vê o ser humano como agressor capaz de usar
          toda sua inventividade para destruir a natureza, constituindo assim “nossa tragédia”, na qual estariam os seres humanos “presos
          no mecanismo de nossa autodestruição”. McNeil (2005. p. 20), na mesma perspectiva apresentada por Schama, nomeia-a de
          “história de decadência”.



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