Page 59 - Uma Breve História da Legislação Florestal Brasileira
P. 59
voltando aos patamares só vistos antes de 2008. Essa tendência é fruto de um fenômeno
amplamente denunciado como “desmonte da política ambiental”(Leão Pereira et al., 2019);
(Ferrante e Fearnside, 2019) e está se consolidando particularmente durante governo Bolso-
naro (2019-presente). Sob a liderança de Ricardo Salles no Ministério do Meio Ambiente,
a política ambiental está cada vez mais orientada por um discurso que inverte os papéis ao
colocar fiscais do Ibama como “vilões”, e garimpeiros e grileiros como “heróis” nacionais
(Ferrante e Fearnside, 2019).
As evidências desse desmonte estão se acumulando tanto no Poder Executivo como
no Poder Legislativo. Em especial, o Ministério do Meio Ambiente enfraquece a fiscalização
ambiental. Após uma reação contundente da sociedade civil e de investidores no Brasil e no
exterior, o governo promoveu mudanças, como a criação do Conselho Nacional da Amazônia,
liderado pelo vice-presidente da República, General Mourão, e realizou ações pelas Forças
Armadas de combate às queimadas e ao desmatamento, as quais, contudo, se mostraram muito
mais onerosas e menos eficientes do que as ações dos órgãos ambientais de controle (Potter,
2020). Soma-se a esse cenário a lentidão das ações do SFB, que ficou sob responsabilidade do
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento desde 2019, distanciando-se das perspec-
tivas de implementação do Código Florestal. Por outro lado, percebe-se um risco crescente de
fragilização da legislação florestal brasileira no âmbito do Poder Legislativo. Primeiramente,
houve tentativas de revogar os dispositivos que regulam a Reserva Legal Capítulo IV, artigos
o
12 a 25 da Lei no 12.651, de 25 de maio de 2012, através dos Projetos de Lei n 1.551 e n
o
2.362, de 2019, mas ambos os projetos foram retirados pelos autores após pressão da ala mais
progressista do próprio agronegócio. Contudo, além de outras propostas, pequenas flexibilizações
e grandes “jabutis” em projetos de lei não relacionados ao Código Florestal continuam em tra-
mitação no Congresso Nacional. São projetos que flexibilizam de forma contundente o Código
Florestal, como o Projeto de Lei n° 5.186, de 2019, do senador Irajá (PSD/TO), que permite
a compensação de Reserva Legal desmatada a qualquer tempo, por área equivalente ao dobro
da área desmatada, o que levará a perda de biodiversidade, concentração de áreas conservadas
em locais de baixo custo e vazios de vegetação natural, comprometendo a disponibilidade de
água e polinizadores, essenciais à própria atividade agropecuária.
Em reação às taxas crescentes de desmatamento, houve reação dos mercados interna-
cionais com ameaças de boicote, desinvestimento e não ratificação do acordo comercial entre
União Europeia e Mercosul. Apesar desses sinais terem o potencial de se contrapor à tendência
de desmonte ambiental, a demanda crescente da China fez com que aumentassem as vendas e a
margem de lucro do agronegócio, gerando ceticismo sobre a efetividade da pressão internacional.
Tanto esses esforços de fragilizar o Código Florestal quanto as tentativas para implementá-lo e
fortalecê-lo, mencionadas acima, indicam que os dispositivos da legislação florestal brasileira
continuam altamente disputados ao entrar da década 2020.
57