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ENTREVISTA




                                                              o planeta se tornar praticamente inabitável. E
                                                              esse risco existe, a ciência mostra com clareza.
                                                              Por isso que eu considero o maior desafio da
                                                              humanidade: não podemos deixar o planeta ul-
                                                                          o
                                                              trapassar 1,5  C.

                                                                O senhor já apontava nos anos 1990 sobre
                                                              o risco de chegar a um ponto de não retorno
                                                              diante do avanço do desmatamento na Ama-
                                                              zônia. Em que estágio estamos no momento?

                                                                À beira do precipício. Alguns cientistas inclusive
                                                              acham que o extremo sul da Amazônia, na tran-
       Divulgação/Nasa                                        sição para o cerrado, já passou desse ponto. Ali já

                                                              começou um processo de degradação completa
                                                              porque aumenta muito a mortalidade das árvores,
        Imagem registrada por satélite aponta aquecimento do oceano   o fogo começa a se espalhar pelo chão da floresta.
        Pacífico com a chegada do El Niño
                                                              Há cientistas que julgam que aquele sul já passou.
                                                              Eu  e  vários  outros  cientistas  ainda  acreditamos
        tos e muitos milhões de anos, desde quando não        que é possível salvar a Amazônia.
        existiam nem os nossos antepassados, antes de
        Homo sapiens, Homo erectus, primatas.                   Para salvar a Amazônia, precisamos fazer duas
                                                              coisas simultânea e imediatamente. A primeira é
           Nós evoluímos num clima muito diferente do         zerar o desmatamento, a degradação e o fogo.
        que ele pode vir a ser. Isso vai trazer um enorme     Temos que educar muito os pecuaristas brasilei-
        risco até mesmo para a sobrevivência humana           ros a não usar mais fogo para a regeneração da
        em grande escala. Nesse cenário terrível, no fi-      pastagem degradada. Além disso, a extração sele-
        nal do século, centenas de milhões de pessoas         tiva de madeira, que é quase toda ilegal na Ama-
        terão que se mudar para montanhas muito al-           zônia, leva também a uma grande degradação e
        tas, o topo dos Andes, dos Alpes. E o Ártico e a      espalhamento do fogo. Ao mesmo tempo, pre-
        Antártica vão ser lugares para se abrigar, porque     cisamos ter sucesso no acordo de Paris, de não
        lá as temperaturas, por mais que subam bastan-        deixar a temperatura passar de 1,5° C.
        te, ainda não atingirão esses limites fisiológicos
        do corpo humano. Se não tivermos sucesso no             Junto com isso, devemos criar na Amazônia
        acordo de Paris, há risco de chegarmos a esse         talvez o maior projeto de restauração florestal do
        ponto, que a gente chama de ultrapassar os            planeta. Nós chamamos esse projeto de Arcos da
        pontos de não retorno.                                Restauração, que é esse arco do desmatamento
                                                              que vai do Oceano Atlântico até a Amazônia bo-
           Se aquecermos muito os oceanos, o risco é          liviana, passando pelo sul do Pará, norte de Mato
        gigantesco. Tem tanto metano armazenado no            Grosso, sul do Amazonas, Rondônia, Acre e a
        fundo dos oceanos que vamos realmente fazer           Amazônia boliviana. Essa área com maior risco,




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